Texto 1
Economia e política são duas áreas interligadas e interdependentes, pois ambas estão relacionadas ao comportamento humano.
Na evolução da humanidade, desde os primórdios, quando os grupos sociais se organizaram e passaram a viver em sociedade tendo como propriedade um território, um povo e um Governo, estava criada uma importante instituição que iria regular, prover e garantir o funcionamento e desenvolvimento dessa sociedade: o Estado. Com o Estado advém as formas de governo e adoção da política como instrumento para garantir o funcionamento desejável dessas sociedades. Portanto, partindo desses princípios, a interação entre Estado, Economia e Política é um dos temas mais complexos e fundamentais da filosofia e das ciências sociais.
Para termos uma base analítica do pensamento filosófico e sua evolução, expomos a seguir as visões de cinco principais pensadores: Nicolau Maquiavel, Thomas Hobbes, Adam Smith, David Ricardo e John Stuart Mill. Através do pensamento desses autores clássicos da economia e da política, é possível traçar uma linha evolutiva que vai de uma primazia da política sobre a economia a uma visão em que a economia tem uma lógica própria, com a política assumindo um papel de regulação e suporte, tendo como agente o Estado, que tem papel ativo no funcionamento de todo esse sistema.
1. Nicolau Maquiavel: A Economia como Ferramenta do Poder Político
Para Maquiavel, a política é a arte de conquistar e manter o poder. Em O Príncipe, a economia não é um campo de estudo separado, mas sim uma dimensão subordinada à estratégia do governante. O controle dos recursos financeiros (como a tributação) e a prosperidade do povo são cruciais para a estabilidade do Estado e para evitar a revolta. A frugalidade do príncipe, a não-confiscação de bens e a capacidade de armar e sustentar um exército são elementos econômicos diretamente atrelados à virtù política. A interação é unidirecional: a economia existe para servir aos fins do Estado e do poder. Não há uma "mão invisível" do mercado; há a mão astuta e, por vezes, cruel do príncipe.
2. Thomas Hobbes: A Política como Pré-condição da Economia
Na visão de Hobbes, expressa em O Leviatã, o ponto de partida é o "estado de natureza", um estado de guerra de todos contra todos. Nesse cenário, não há espaço para a economia, pois a falta de segurança impede qualquer forma de produção, comércio ou acumulação de riqueza. A vida é "solitária, pobre, desagradável, brutal e curta". A criação de um Estado soberano e absoluto, o Leviatã, é a única solução para impor a ordem e a lei. A interação entre política e economia é clara: a política, na forma do Estado, é uma pré-condição existencial para que a economia possa florescer. O Estado deve garantir o direito de propriedade e a segurança dos contratos, permitindo que os indivíduos possam produzir e transacionar com confiança. A economia não tem autonomia; ela é uma criação e um produto do poder político.
3. Adam Smith: A Economia como Ordem Natural e a Política como Protetora
Adam Smith, em A Riqueza das Nações, inverte a lógica de seus antecessores. Ele eleva a economia a um campo com suas próprias leis e mecanismos de autorregulação, impulsionados pelo interesse individual e pela competição. A famosa "mão invisível" do mercado coordena os esforços individuais em benefício da sociedade como um todo. Na sua visão, a interação ideal entre os três elementos é de subordinação da política à economia. O Estado (política) deve ter um papel limitado, o de Estado-vigia:
Proteger a sociedade da violência e invasão de outras nações.
Proteger cada membro da sociedade da injustiça e opressão.
Erguer e manter certas obras e instituições públicas que não seriam vantajosas para um indivíduo ou grupo privado. Qualquer interferência política na economia, como tarifas, subsídios ou monopólios, é vista como uma distorção que prejudica o crescimento e a prosperidade.
4. David Ricardo: A Política como Fator na Distribuição da Riqueza
David Ricardo, um economista clássico que se baseou em Smith, aprofundou a análise econômica, mas introduziu uma visão mais conflituosa. Em Princípios de Economia Política e Tributação, ele se concentrou na distribuição da renda entre as classes sociais: capitalistas (lucro), trabalhadores (salário) e proprietários de terras (renda). Ricardo reconheceu que a política, através da legislação, tem um impacto direto e significativo nessa distribuição. Sua crítica às Leis dos Cereais na Inglaterra é um exemplo clássico. Ele argumentou que a proteção aos proprietários de terras, através da manutenção de altos preços dos grãos, beneficiava uma classe em detrimento de outras e impedia o desenvolvimento industrial. A política, para Ricardo, não é apenas um mero protetor do mercado, mas um ator que pode inclinar a balança econômica, gerando desigualdade e afetando o crescimento a longo prazo.
5. John Stuart Mill: A Intervenção do Estado para Corrigir Falhas do Mercado
John Stuart Mill, o pensador de transição entre o liberalismo clássico e o liberalismo social, marca um ponto crucial nessa evolução. Ele concordava com Smith e Ricardo sobre a importância do livre mercado e da propriedade privada para a produção de riqueza. No entanto, em Princípios de Economia Política, ele distinguiu as "leis da produção" (que seriam leis naturais) das "leis da distribuição" (que seriam sociais e, portanto, passíveis de intervenção política).
A grande contribuição de Mill é a justificação para a intervenção estatal. Ele argumentou que, embora o mercado seja eficiente na produção, ele pode falhar na distribuição justa da riqueza e na promoção do bem-estar social. A interação entre Estado, Economia e Política, na visão de Mill, é mais complexa e matizada. O Estado deve:
Corrigir as "falhas do mercado".
Garantir um mínimo de educação e saúde.
Proteger os direitos dos trabalhadores (embora com cautela).
Promover a igualdade de oportunidades.
Regular monopólios e externalidades negativas (como a poluição).
Em suma, Mill defende um papel mais ativo para a política, não para subverter a economia, mas para aperfeiçoá-la, garantindo que os benefícios da riqueza sejam distribuídos de forma mais equitativa e que a sociedade como um todo prospere. Sua visão lança as bases para o liberalismo moderno e para o conceito de Estado de bem-estar social, onde a política não se limita a ser guardiã da economia, mas também seu regulador e corretor.
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